"Nós não precisamos de nenhuma educação//não precisamos de nenhuma lavagem cerebral." Esse trecho da música "Another Brick in the Wall" de Pink Floyd, escrita por Roger Waters e lançada em 1979 critica o sistema educacional britânico, embora possa ser interpretado como uma crítica genérica à educação daquela época. A escola era vista como um espaço rigoroso, pouco criativo e opressor. O filósofo e antropólogo colombiano Jesús Martín-Barbero, que faleceu em 2021, descrevia a escola como um dos sistemas mais rígidos da sociedade, o que dificultava sua transformação.
Clayton M. Christensen, no livro "Inovação na Sala de Aula" (2011), argumenta que a verdadeira disrupção educacional ocorreria com a adoção de um ensino centrado no aluno. Inicialmente, as plataformas deveriam facilitar a criação de conteúdo pelo usuário e, posteriormente, desenvolver redes que promovessem produtos de aprendizagem online.
Christensen aprofundou o debate sobre a evolução escolar, enfatizando a necessidade de um modelo em que o professor atuasse como criador de ferramentas destinadas a atender diversos tipos de estudantes. Um aprendizado centrado no aluno permitiria analisar as necessidades individuais e utilizar ferramentas capazes de autodiagnóstico, realizadas por professores, pais e alunos. Estaríamos caminhando para isso com a Inteligência Artificial?
Os primeiros passos para o uso da IA na educação remontam à década de 1950, com a aprendizagem programada e o desenvolvimento subsequente da instrução assistida. Na década de 1980, desenvolveu-se um sistema mais avançado de tutoriais inteligentes. A década de 2010 marcou um ponto de inflexão com a proliferação de programas como IBM e Edutech, aplicáveis a ambientes educacionais.
Escola chinesa avalia desempenho em tempo real
Na última década, inúmeras inovações tecnológicas passaram a integrar o cotidiano escolar. Um exemplo controverso, publicado pelo The Wall Street Journal, ilustra o avanço da IA na China. Alunos de uma escola primária utilizam dispositivos de detecção de ondas cerebrais que medem o nível de concentração. Sensores captam sinais elétricos dos neurônios, enviando-os ao computador do professor, que pode, em tempo real, avaliar o engajamento dos alunos nos exercícios de matemática, por exemplo.
O desempenho é medido em gráficos e avaliados pelos professores e pelos pais. Assim, é possível perceber como está o nível da turma, as dificuldades e o envolvimento individual. A mesma escola utiliza robôs espalhados pelas bibliotecas que também são capazes, entre outras coisas, de fazer leituras faciais e perceber o nível de atenção dos alunos durante as leituras.
O vídeo da reportagem do The Wall Street Journal sobre essa escola chinesa levanta questões relativas à privacidade e à pressão por resultados. Entretanto, a discussão aqui se concentra na capacidade da análise de dados de identificar as dificuldades individuais, possibilitando uma aprendizagem ajustada antes de avaliações formais. Não seria bem melhor o aluno conhecer suas falhas, ter tempo de aprender, antes de uma prova valendo ponto?
A pandemia de Covid-19 acelerou a adoção de tecnologias digitais nas escolas, ampliando significativamente o uso de ferramentas como Google Classroom e Microsoft Teams. O experimento na China é apenas um dos avanços proporcionados por tecnologias como a Internet das Coisas, Inteligência Artificial e Análise de dados.
A crítica à educação e sua evolução nos últimos séculos nos mostrou um modelo de aula "um para todos" e o papel do professor conteudista. Considerando que a quantidade de informações no mundo dobra a cada 72 dias (em 1750, dobrava a cada 150 anos), o modelo tradicional de ensino é inadequado. O professor, antes centralizador do conhecimento, agora deve articular saberes, usando dados para personalizar o aprendizado.
O OLPC (One Laptop Per Child), desenvolvido pelo MIT em 2005, buscava democratizar o acesso à tecnologia, distribuindo computadores a crianças de países em desenvolvimento. Alguns anos depois, em 2019, o projeto "One Tablet Per Child" distribuiu quase 11,5 mil tablets a estudantes de Malta. Iniciativas semelhantes se espalharam pelo Brasil, focando no acesso a computadores, tablets e laptops. A ideia é promissora, mas exige que o professor desenvolva metodologias que integrem o uso dos dispositivos de maneira eficaz. Os dispositivos, apesar de importantes, não são a solução completa para tornar a sala de aula mais interativa, divertida e imersiva.
Dar acesso a computadores e tablets é, sem dúvida, um avanço significativo que ajuda os alunos no desenvolvimento das atividades escolares e consumo de conteúdo. As tecnologias hoje servem como meio para facilitar o fluxo informacional entre professor e aluno. Mas, ainda assim, o modelo educacional continuava o mesmo, dando pouco protagonismo ao estudante e poucas (ou nenhuma) informação individual sobre o desempenho dos alunos.
Professores facilitadores
Nesse contexto, a Inteligência Artificial assume um papel crucial, mas o desafio é integrar adequadamente a tecnologia sem substituir a interação humana, que é vital para a empatia e o entendimento contextual. O papel do professor se transforma: de transmissor de conhecimento para facilitador, observador atento da individualidade de cada aluno, usando a IA para tomar decisões informadas e proporcionar um percurso de aprendizagem mais eficaz.
Portanto, os professores devem se posicionar como "seres conhecedores", entendendo seus alunos a partir de seus estágios de desenvolvimento cognitivo, emocional e físico. Isso é possível tanto em ambientes presenciais quanto online, mudando a lógica da sala de aula para melhor atender às necessidades individuais e promover um ensino mais inclusivo e eficiente. O professor sempre teve o papel de mediador fazendo a articulação entre o conhecimento e o contato do aluno. No professor de IA, a interação, por mais sofisticada que seja, sempre será entre uma máquina e um humano. E isso distância, gera uma reação que limita a aproximação do aluno, não é empático e o pior, a máquina não enxerga contexto.
Professores articuladores e "seres conhecedores"
O papel do professor será também de articulador de saberes usando inteligência de dados para customizar o aprendizado e permitir uma caminhada mais frutífera do aluno. A avaliação do conhecimento não precisa ser, necessariamente, medida por meio de uma prova. Ela pode ser observada em tempo real para evitar discrepâncias entre os alunos. A análise preditiva dos dados de cada aluno permitirá ao professor uma tomada de decisão precisa, direta e individualizada.
Cada vez mais, os professores devem assumir um papel de "seres conhecedores" segundo Lee Sang-eun. Quanto mais eles souberem sobre seus alunos, maior será a sua capacidade de ensinar a eles. E isso não está restrito a sala de aula presencial, é possível também no ambiente on-line. Os alunos precisam ser observados a partir de seus estágios de desenvolvimento cognitivo, emocional e físico. "Os professores não estão mais confinados como seres conhecedores que identificam seus alunos com base no que já sabem“, completa o autor.
Em um mundo de conhecimento e acesso abundantes, a lógica da escola deve ser alterada. O professor precisa ter uma papel de facilitador, um olhar atento e capaz de observar cada ser humano em sua individualidade, entendendo suas dificuldades e dando caminhos. A Inteligência Artificial pode facilitar esse processo reunindo dados, analisando planilhas e contribuindo para a tomada de decisão. O professor muda de lugar na sala de aula. Ele deixa de depositar conhecimento no aluno e passa a mapear e conduzir saberes.
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